A gente reclama – e com muita
razão – dos desmandos e corrupções dos governos, igrejas, sindicatos, empresas,
ONGs, instituições em geral. Mas não somos muito bons em atentar e controlar o
que nos diz respeito diretamente. Às vezes passamos de atitudes autoritárias e
irracionais (burocráticas, repressoras, chatas, chatíssimas) para um relaxo
total, um descaso.
Parte dessa atitude irresponsável
é diluída porque, ao nível macro, demoramos a perceber as conseqüências da
falta de atenção e cuidado com as nossas coisas e, o principal, com as coisas
comuns. Mas o preço a pagar é caro. Pagamos em duplicidade a segurança, a
educação e a saúde, porque pagamos os impostos e se quisermos, como classe
média, um serviço melhor, temos que pagar – novamente – a escola privada, o
plano de saúde a segurança particular com suas câmeras, fios elétricos,
alarmes, chiliques e frescuras típicas do povo da segurança. Pagamos, no geral,
cada vez que há enchentes, desmoronamentos, incêndios, crimes, omissões,
acidentes evitáveis em hospitais e clínicas. A lista é enorme.
Mas, ao nível micro, as
conseqüências são mais rápidas e evidentes. Estou passando por isso. Moro em um
condomínio de classe média (apartamentos de dois e três dormitórios), em São
Paulo, entre a Liberdade e a avenida Paulista. Lugar bom. Prédio legal. São
duas torres de 26 andares, com um total de 364 apartamentos. Imenso, e
complicado de administrar. Mas, veja a piscina:
Agora, veja o aviso nos
elevadores:
Percebe? Os moradores do
condomínio urinam nas piscinas. Isso é uma rematada falta de educação para com
os outros e para consigo mesmo. Mas não acaba aí. Os carrinhos para levar
compras do supermercado, que estão no subsolo, tem lacres que só são abertos
com cartões numerados de cada apartamento (isso deve ter no seu prédio,
também). Por que? Porque senão as pessoas levam as compras nos carrinhos e não
os devolvem às garagens. Se o carrinho fosse robotizado era só dar a ordem:
“Volta pra garagem.”, e pronto. Mas não é. E sem contar as discussões imensas
nas reuniões de condomínio, que eu não freqüento, não tenho saco pra isso. Mas
pago. E tem um sindico, uma comissão de conselheiros e a administradora, a
Lello Condomínios.
Pois bem ,desde ontem, estamos
sem gás no prédio. A Congás (aqui é gás encanado, vem da rua) cortou o gás por
falta de pagamento. As torres estão sem banho quente e sem fogão (quem tem
microondas que use – eu não tenho porque não gosto e raramente cozinho em
casa). Mas há um monte de velhinhos, crianças e algumas mulheres grávidas que precisam
comer em casa e tomar banho quente ou, pelo menos, morno.
Ao descer à administração para
averiguar o nível da asneira me deparei com as contas de gás e lá está, muito
claro:
Em todas as contas consta a falta
de pagamento e durante anos (o debito é de 2010) nada foi feito para resolver,
então, por fim, cortaram o gás. Essa é a irresponsabilidade que nos cabe, pois
desde o síndico e os conselheiros, até a administradora, a Lello, ninguém fez
NADA de eficaz e eficiente para evitar o corte. Só blá-blá-bla, nhém-nhém-nhém
e desculpas, explicações rotas, caras tontas e perdidas ante a fatalidade
provocada de um erro sistematicamente a anunciado.
Enquanto não nos conscientizarmos
de nossas responsabilidades diretas e indiretas, não haverá melhorias significativas
na qualidade de vida e na sociedade em geral. Mas nossas classes médias são
retrógradas. Ou alienadas. Ou metidas e arrogantes. Urinam em suas piscinas e
não querem saber de controlar as contas mensais, mesmo que tenham sido eleitas
para isso. São plenas de bonomia. São caretas ou, então, permissivas e
superficiais. Adoram babaquices edulcoradas e bonitinhas que falam de amor e
paz, de florzinhas e sentimentos, mas com poucas ações efetivas que melhorem
suas relações e convivências. Claro que me incluo nessa classe média, afinal
somos uma faixa da população que sofreu, na pele, os mandos e desmandos nas
últimas décadas, mas isso não justifica nossa omissão.
Por isso eu escrevo. E me acuso,
juntamente com a sociedade da qual participo.
Espero que o gás volte até o
Natal. Já vieram religar, mas constataram que alguns apartamentos estão com os
registros abertos. Daí foram embora, pois há o riso de explosões. Há que se ter
certeza de que todos os 264 apartamentos estão com os registros fechados. Está
vendo a amplitude de uma irresponsabilidade? De nossa incompetência?
É o fim do mundo, como o
conhecemos.
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