domingo, 15 de junho de 2014

Copa do Mundo - Experiências e reflexões

Assisti a festa da abertura da Copa em São Paulo, na casa de amigos. Não comentarei a apresentação (pobre e sem muita graça) e nem o pênalti duvidoso, mas é hilário que só o Brasil tenha marcado gols no jogo com a Croácia... Mas comentarei a estupidez de parte da torcida. Vaiar autoridades, tudo bem. Xingar explicitamente uma senhora que é Presidenta (isso mesmo, presidenta é português absolutamente correto) em frente às câmeras globais é boçalidade. As pessoas reclamam da falta de educação dos mais pobres e humildes mas se esquecem propositalmente que as nossas classes médias possuem um nível anormal de obtusidade social. Isso posto, curti a vitória e se os croatas não gostaram do juiz azar deles. Também tivemos juízes carrascos no passado e ainda há o longo caminho dos jogos pela frente. Que isso não se volte contra nós, já que o malfadado pênalti foi dúbio mesmo.



Na sexta-feira 13, dia de Santo Antonio, decolei logo cedo de Congonhas rumo à Belo Horizonte. Graças à paciência do meu amigo Edmur Stoppa, que ficou horas na fila virtual da FIFA, conseguimos ingressos para Colômbia e Grécia, no dia 14, no Mineirão. Faço questão de assistir alguns jogos desta Copa no Brasil. A decolagem foi especial por conta das nuvens que matizaram o sol sobre São Paulo e o Pico do Jaraguá.





No aeroporto de Confins estava o jato da GOL especialmente pintado para transportar a seleção brasileira. Nos dias vagos ele opera normalmente em outras rotas.



Com os preços absurdos dos hotéis (R$ 900,00 a diária do Mercure, por exemplo), vali-me dos contatos acadêmicos e fiquei hospedado na prestigiosa FAJE, uma das ilhas de excelência dos jesuítas (juntamente com a Unisinos, RS e a PUC-RJ). Pena que as aulas já acabaram e a biblioteca suntuosa está fechada, mas a hospitalidade continua ótima.




Na noite de sexta-feira a hospitalidade mineira dos amigos antigos manifestou-se solenemente. Saí com Sérgio Martins (esq.) e sua esposa, Rosilene e o Cristiano Lopes. Todos são turismólogos e o Sérgio foi presidente da ABBTUR Nacional quando a instituição atingiu o auge de sua existência. Os congressos tinham de três a cinco mil pessoas e a área acadêmica florescia pelo país.   



No sábado, dia do jogo, o acesso foi absolutamente tranquilo, organizado e rápido. Nas proximidades do Mineirão, as concessionárias de automóveis e várias lojas colocaram vários tipos de blindagem para evitar o vandalismo que ocorreu na cidade na Copa das Confederações. Essa concessionária radicalizou, colocaram containers velhos servindo de muralha contra a violência que, por sinal, não houve.


Foi só festa e confraternização entre torcidas. Colombianos, gregos, brasileiros e ouros povos riram, brincaram e curtiram um dia de sol e alegria do futebol.


Com minha camisa oficial personalizada (nome e idade)...


... fui cedo para conhecer a estrutura do evento, ver a Fan Zone, olhar o povo e sentir o clima da Copa. É um tesão existencial.


Parabéns à Belo Horizonte, tanto pela organização em geral como pela eficiência e produzir guias em três idiomas, com muita informação, bem elaborados e em numero suficiente para os visitantes. Conversei com vários voluntários(as) e funcionários de diversas instituições e senti, no geral, disposição, boa vontade e competência.



O estande da Coca-Cola tinha essa garrafa imensa formada por latinhas de todos os lugares do mundo.



Edmur Stoppa e eu curtimos muito o evento. Como ele é especialista em futebol, ir com ele vale por umas aulas de esportes e organização de campeonatos. 



Gregos e colombianos brincaram muito com suas fantasias e cores. Fiquei ao lado de um colombiano que mora com a família em Washington DC. Conversei com muita gente e senti que estavam à vontade no Brasil e em BH.



O garoto sentiu na pela sua primeira Copa em um país diferente.


FIFA, fonte de crise, bens e males para o futebol e para os países-sede, uma organização criticada, adorada, odiada mas desejada como marca que pode ajudar outras marcas. Entre contradições e paradoxos, a Copa do Mundo vai se desenvolvendo no Brasil. 


A festa ocorre ao longo dos dias, estádios e situações diversas. Como escrevi no post anterior, o Brasil conhecerá melhor sua cara (e outras coisas) depois deste mês insólito e especial.


Vale a festa, o humor, a torcida e o furor.


BH mostrou que se preparou a duras penas para o evento. As obras viárias não ficaram prontas e nem o aeroporto, mas a Arena e seu entorno funcionou direitinho. Os mineiros reclamam das medidas da Polícia Militar que proíbe os carros de estacionarem nos arredores durante os dias de jogo. Nada que não possa ser melhorado e acertado.


A onda amarela colombiana tomou conta da Arena. Dos 57 mil torcedores, uns 80% eram da Colômbia. Que a festa continue.

quinta-feira, 12 de junho de 2014

Copa do Mundo - Brasil, mostra a tua cara








Escrevo horas antes da Copa do Mundo, em São Paulo, um texto para ser lido também depois do megaevento.  É uma reflexão livre, leve e solta sobre os dias que vivemos tão intensamente. 

O Brasil realiza um sonho torto de aparecer perante a comunidade internacional, 29 anos após o fim de sua última ditadura militar (1964-1985). Festeja também o fim do quinto mandato presidencial dito “de esquerda” (FHC, Lula e Dilma), vive um ano de eleições majoritárias com coices a granel, e já se passou um ano das avassaladoras revoltas urbanas que sacudiram o povo, em junho de 2013. Também está no meio de divisões opinativas sobre a conveniência ou não de sediar a festa que é propriedade da FIFA, mas que todo mundo adora mostrar em seu território. A apoteose do futebol, do espetáculo midiático e do lucro (institucional, corporativo e político) rolará por um mês neste país tropical que possui desde o complexo de superioridade hiper-megalônamo até o complexo de vira-lata sarnento e vadio. Somos nacionalistas e globais, jecas e descolados, coxinhas e pimentinhas, putos e santos, simplistas e complexos, abusados e recatados, brutos e amáveis (ou seja, cordiais), sábios e estúpidos, espertos e otários... Só não sabemos diferenciar exatamente os momentos de sermos um ou outro. Assim como os outros povos do mundo, vivemos angústias e dúvidas entre o ser do sonho e o da existência crua, nua e bela.

A diferença é que somos imensos, seja no  território, na população, no bom humor ou na porra-louquice. Temos as nossas suscetibilidades e manias. Fazemos merda e mousse de chocolate com a mesma facilidade e desfaçatez. Vivemos em um mundo único e gigantesco, temos dificuldade de entender nossos próprios irmãos de cidadania, de língua e imaginário. São muitas culturas, expressões, taras, belezas, sabores e cores que vicejam em nossas férteis terras. Por isso que somos difíceis de entender. Os mexicanos, os russos, os hindus e os chineses bem sabem do que estamos falando, pois são igualmente múltiplos (sem contar os europeus, os islâmicos, os gringos e os paraguaios, igualmente estuporados). Somos complicados, mesmo. 

Por isso é ótimo termos os olhos estrangeiros sobre nós, assim imaginaremos o que eles pensam ao nosso respeito ou, pelo menos, o que pensamos que eles pensam. Isso nos leva a pensar sobre o que nós mesmos pensamos desta bagunça, deste esculacho que a gente tenta organizar segundo nossas crenças e tabus, dogmas e teimas. 

Esse monte de estrangeiros perambulando por nossas cidades, filmando, fotografando, postando, comentando, servirá de espelhos para as nossas consciências, as boas e as más. Miríades de olhos e lentes, ouvidos e microfones, opiniões e análises, piadas e elogios nos cercarão por todos os lados. Veremos a nós mesmos ante nossos olhos esbugalhados; refletidos na mente e nas mídias nacionais; e, o mais terrível, veremos a nós mesmos pelos olhos ferinos da mídia internacional, pela voz, imagem e textos alienígenas. 

Os antigos diziam que há males que vem para bem. A Copa é um bem e um mal. É um bem porque traz diversão, farra, exposição global, inovações e lucros. É um mal porque gera conflitos, turrices, exposição global, brigas e gastos mal feitos. Mas o ótimo e excelente é que ela nos traz uma reflexão crítica, pelo menos para os que não são absolutamente tacanhos ou boçais.

Quando o último jogo acabar e os visitantes estiverem voltando para suas casas, teremos então uma imagem mais real e colorida deste imenso país que nos encanta e irrita com suas coisas brazucas e brasilianas. Relembraremos os acertos e os erros, as coisas boas e os problemas; muita gente terá chiliques com alguns comentários e imagens do nosso jeito tão gostoso de ser. Vislumbraremos nas mídias, assim como em nossas memórias e consciências, um perfil mais detalhado e rico do Brasil. Gostaremos do que surgirá um mês após toda a logística, shows, articulações, jogos, achaques, crises e trabalhos insanos para garantir a Copa do Mundo de 2014? Teremos do que nos envergonhar pelas próximas décadas, algo mais trágico que a derrota histórica de 1950, em pleno Maracanã? Sobrarão mais júbilos ou mais ressentimentos? Prevalecerão as boas ou as más fés? Seremos hexa?

É impossível fazer previsões, resta-nos torcer para que o grande saldo seja positivo. As certezas é que conheceremos mais amplamente nossas caras e mentes, mais profundamente os nossos corações e anseios. Isso é bom. Logo depois haverá as eleições majoritárias. Os problemas estruturais continuarão dependendo de nossa vontade política e das ações de cidadania para se resolverem. Há sempre um país a construir, uma sociedade a melhorar e novos sonhos para viver. Por hora, a letra de Cazuza é oportuna e emblemática do momento histórico que vivenciamos:

“Brasil!
Mostra tua cara
Quero ver quem paga
Pra gente ficar assim
Brasil!
Qual é o teu negócio?
O nome do teu sócio?
Confia em mim...”

Luiz Gonzaga Godoi Trigo, 2014













domingo, 8 de junho de 2014

Turismo sertanejo

De 5 a 7 de junho rolou, em João Pessoa (PB), na UFPB, o II Congresso Nacional de Turismo Comunitário e o VIII Simpósio de Turismo Sertanejo. Aconteceram oito conferências, três mesas redondas e oito Grupos de Trabalho com cerca de 60 apresentações.






Parte da delegação da UFS - Universidade Federal de Sergipe.


O prof. Giovanni Seabra (UFPB), geógrafo (UnB) com doutorado na área (USP), é o coordenador do evento e o idealizador de várias pesquisas, eventos e publicações sobre turismo sertanejo. Seabra é referência nacional e internacional, tendo mapeado e analisado muitos roteiros turísticos sertanejos no nordeste brasileiro. Atualmente realiza um estudo comparativo entre nossos roteiros e o deserto de Atacama, no Chile. Ele consegue articular pesquisadores nacionais interessados nos segmentos de turismo rural, ecológico, sertanejo e tudo o que se relaciona com comunidades e meio ambiente. 





Outros professores como Anderson Pereira Portuguez, Jean Carlos Vieira Santos, Luzia Neide Coriolano e o próprio Seabra lançaram livros. O volume sobre a Paraíba é a última produção de Seabra e faz uma análise vasta e profunda sobre o estado da Paraíba.





Anderson Portuguez, Luzia Neide e eu, em um dos intervalos das atividades.





Um momento interessante do evento é conhecer as pesquisas e projetos dos novos participantes dos jogos acadêmicos, com seus mestrados e doutorados.


Alguns dos livros de Seabra. o Turismo Sertanejo (João Pessoa: Ed. Universitária/UFPB, 2007), é um clássico na área, assim como o livro que foi consequência da Conferência da Terra - Fórum Internacional do Meio Ambiente, cuja terceira edição foi realizada em João Pessoa, em novembro de 2012. 



João Pessoa, assim como Natal, Aracaju e Teresina, é uma das capitais de menos porte do Nordeste, com boa qualidade de vida, ótima gastronomia e alguns monumentos históricos como o complexo da igreja de São Francisco de Assis. 

No claustro da igreja havia uma filmagem com temática bíblica. Jesus e turma esperavam a diretora começar a rodar naquele cenário insólito.


A Cachaçaria Philipéia é um ponto de degustação no centro da cidade, onde se experimenta o sabor do néctar destilado da cana mesclado a outros sabores regionais.


No sábado à tarde, em uma das praças da cidade, rola música, cerveja, comidinhas e muita conversa. Nesse final de semana começaram os festejos juninos em Campinas Grande, localizada a uns 120 Km de João Pessoa. Com isso parte da cidade migra durante um mês para as mega-festas anuais que, nessa temporada, se unem à Copa do Mundo. 


Depois da sábia indicação de um ex-aluno que encontrei em João Pessoa, fui jantar no Roccia, ao lado do meu hotel. Saí, além de satisfeito, com uma bibliografia. Ao elogiar a qualidade e fator surpresa experimental da comida, o mâitre Otoniel Abílio da Costa (trabalhou com Laurent Suadeau, no mítico Saint Honoré, do ex-Meridien Rio de Janeiro), agradecido, presenteou-me com seu livro (Arte e Desejo. Recife: Caleidoscópio, 2011). Depois ele apresentou-me o jovem chef Onildo Rocha, que também me presenteou com seu livro "A casa é sua", uma celebração do restaurante. Onildo fez gastronomia na Universidade Anhembi Morumbi e atualmente pilota o restaurante. Juntamente com o Nau (do mesmo grupo do Mangay) é um dos excelentes locais gastronômicos da cidade. 

João Pessoa, assim como Aracaju e Natal, evitou significativamente a destruição imobiliária de sua orla marítima e isso é ótimo. Apesar dos altos índices de violência que assola as capitais nordestinas, não se percebe uma sensação de insegurança, o que não significa tomar os devidos cuidados ao sair. Como fiquei na praia de Cabo Branco, a tranquilidade era ainda maior.