quarta-feira, 5 de agosto de 2015

Qualidade em serviços - História, conceitos e reflexões (5/9)


Texto: Luiz Gonzaga Godoi Trigo, 2015



VI – A história da qualidade em serviços

A American Society for Quality (ASQ - www.asq.org) responde de forma breve à pergunta Por que qualidade em serviço? O setor de serviços se defronta com um desafio especial: atender às necessidades do consumidor ao mesmo tempo em que mantém sua competitividade econômica. Apesar de os processos de automação significarem fortes impactos no resultado final, o setor de serviços ainda depende de trabalho humano intensivo e pode não haver substitutos para a interação pessoal de alta qualidade entre profissionais em serviços e seus clientes.  As vantagens competitivas ficarão com as organizações que obtiverem sucesso garantir a lealdade do cliente através da mais eficiente utilização de tecnologias e pessoas.


Nas nossas atuais sociedades pós-industriais, altamente competitivas, com tecnologias cada vez mais sofisticadas e integradoras, a Qualidade é um diferencial fundamental, uma exigência básica e pode ser uma poderosa barreira de entrada se uma empresa ou instituição conseguir fazer algo que as outras não conseguem. Mas há uma história do processo de reconhecer a qualidade como algo importante para as pessoas em geral, independente de seu poder de compra, etnia, classe social ou lugar geográfico. Mas nem sempre foi assim. É importante compreender o eixo histórico de como a qualidade tornou-se um dever e um direito, um processo, um modo de trabalho.


Para se chegar ao atual consenso sobre a importância da qualidade, vários anos se passaram. A preocupação sistemática com a qualidade surge ao longo da Revolução Industrial, devido à necessidade de se implantarem procedimentos de segurança, controle e padronização nas indústrias que, aos poucos, surgiam em vários lugares do mundo. Portanto, apenas nos séculos 18 e 19 surgem os controles e gestão de qualidade, sendo aperfeiçoados ao longo do século 20, no início quase que exclusivamente no setor industrial. As exceções restringiam-se aos serviços extremamente caros e personalizados de algumas empresas de transporte marítimo (Cunard e White Star Line, por exemplo), alguns hotéis de luxo, lojas exclusivas ou instituições financeiras que atendiam à burguesia mais rica e poderosa dos países desenvolvidos.

Pode-se falar em qualidade nos serviços da antiguidade?

O interesse e a metodologia aplicada à qualidade no setor de serviços, como conhecemos hoje, é bastante recente.  Considerando que a sociedades pós-industriais surgiram por volta da década de 1970 e que os primeiros trabalhos a respeito de qualidade fora da indústria aparecem após a Segunda Guerra Mundial, temos cerca de meio século de pesquisas na área e três décadas de estudos intensivos com foco nos serviços e como são oferecidos aos seus consumidores.

Em seu livro A history of managing for quality (Uma história da gestão para qualidade), J. M. Juran analisa o que seria uma preocupação com qualidade nos antigos períodos históricos em lugares como China, Israel, Índia e Roma. Em um período mais contemporâneo, Juran foca a qualidade na Alemanha, França, Reino Unido e Japão, especialmente relacionada à indústria em geral ou à indústria bélica, no caso da França.  


A ASQ realça o fato de que, entre os séculos 13 e 19, os artesãos da Europa medieval eram organizados em corporações (em inglês, guilds) responsáveis pelo desenvolvimento de normas muito rígidas para a qualidade de produtos e serviços prestados aos seus clientes. Os comitês responsáveis pelas inspeções dos produtos reforçavam as normas através de marcas ou símbolos que eram aplicados aos bens. Em geral os próprios artesãos aplicavam uma segunda “marca” em seus produtos inicialmente para identificá-los. Com o tempo essas duas marcas, do comitê e do artesão, passaram a significar a boa reputação do fabricante. É o início dos produtos considerados “de marca” e, portanto, símbolos de prestígio, bom gosto e condição social e financeira privilegiada.

Caso - Grinling Gibbons (1648-1721)


Nascido na Holanda, de pais ingleses e tendo estudado para tornar-se escultor, Gibbons deixou a Holanda aos 19 anos e foi para a Inglaterra, onde se tornaria famoso por seus entalhes em madeira – decorativos detalhistas e naturalistas. A partir de 1677, Gibbons passou a trabalhar no castelo de Windsor e alguns de seus melhores trabalhos estão na sala de jantar privativa: em volta de um quadro em cima da lareira, a caça abatida, frutas e flores são dispostos em grinaldas sobre pencas de laços. Ele também trabalhou na corte de Hampton e no palácio de Kensington. No último, suas peças incluem as molduras barrocas douradas para os dois espelhos ornamentais na Galeria da Rainha, entalhados de modo a representar cortinas, trombetas e guirlandas de folhagens. Sua técnica brilhante resultou em feitos realistas notáveis como o entalhe de um colarinho de renda em Chatsworth, Derbyshire.

Fonte: MALLALIEU, Huon (org.) História ilustrada das antiguidades. São Paulo: Nobel, 1999. pág. 43.


Marcas famosas surgiram nos variados setores de ornamentação, joalheria, artesanato e mobiliário. Os nomes de artesãos e manufatureiros famosos viraram marcas conhecidas por toda a elite mundial da época que procurava artefatos e objetos exclusivos, não importava o preço. Atualmente essas peças são preciosos artigos para colecionadores de antiguidades.

Na França, entre os séculos 16 e 19, um restrito número de 14 fabricantes de móveis entrou para a história como referência de qualidade de suas épocas. Possuíam diferentes formações profissionais e um grande apego à excelência de seus produtos. Eram arquitetos como Jacques de Cerceau (1515-1585), Abraham Bosse (1605-1676) ou Charles Lebrun ((1619-1690); escultores como Charles Cressent (1685-1768); ou o famoso Bernard Vanrisamburgh (1696-1766), considerado o maior fabricante de móveis do período Luís XV.

As referências apontam como os principais designers de móveis europeus, entre 1860 e 1920, apenas uma dezena de nomes muito exclusivos:

Charles Francis Annesley Voysey
Gustave Serrurier-Bovy
Louis Majorelle
Victor Horta
Josef Maria Olbrich
Hector Guimard
Koloman Moser
Charles Rennie Mackintosh
Joseph Hoffmann
August Hendell

Fonte: MALLALIEU, Huon (org.) História ilustrada das antiguidades, p. 111.




Charles Rennie Mackintosh


Exercício: Acesse seu site de busca na internet e veja algumas das obras desses   designers e observe como suas peças possuem linhas que até hoje agradam os olhares e estilos. Se você fosse decorar uma casa, um escritório ou outro espaço comercial, qual deles você utilizaria como inspiração? Você consegue identificar influências de seu estilo nos móveis vendidos nas grandes lojas?


Na antiguidade os diversos produtos passavam por processos artesanais. As peças destinadas às classes dominantes (nobreza, dirigentes, sacerdotes) eram confeccionadas com cuidados extremos pelos mais competentes artesãos locais ou trazidos de outros lugares. Pode-se dizer que nesse processo havia uma sistematização de qualidade, mas apenas nas peças destinadas às elites da época. Não havia democratização ou produção em massa.

Inúmeros artefatos foram produzidos e alguns sobreviveram em museus, galerias de artes, antiquários ou em coleções privadas (veja a seguir o site do Louvre Des Antiquaires):


 Tapeçarias
Bordados
Trabalhos com retalhos (patchwork) e acolchoados
Chintz e outros algodões estampados
Renda
Roupas
Xales de caxemira
Esculturas
Pinturas
Vidros
Cerâmica
Ourivesaria

http://www.louvre-antiquaires.com/ 

Essa produção pré-industrial floresceu na Europa, na Ásia e no Oriente Médio e mescla os aspectos utilitários com a expressão artística mais acabada e representativa de determinada cultura ou civilização.

Algumas dessas artes desenvolveram-se para objetivos aparentemente prosaicos como saber as horas, escrever ou localizar-se no espaço. Os primórdios da revolução industrial viram nascer relógios, canetas, bússolas e astrolábios cada vez mais precisos, resistentes e bem desenhados. As navegações exigiam esses instrumentos para sua segurança e controle. Os mosteiros precisavam dos relógios mecânicos, que começaram a ser usados em 1350, para saber as horas das orações. Em meados do século XVI várias cidades européias possuíam uma torre com um relógio público e a partir desse modelo outros foram instalados nas prefeituras, igrejas e nos estábulos das fazendas, sendo chamados de relógios de torreão.

Entre os séculos XVI e XVII havia relojoeiros famosos como os ingleses Joseph Knibb, Daniel Quare e George Graham, o francês Isaac Thruet ou o matemático suiço Jost Burgi (1552-1632), um dos inventores do logaritmo, dividindo a glória da descoberta com o matemático escocês John Napier. Eles produziram relógios de carrilhão, de pêndulo e de mesa, globos mecânicos e relógios de bolso. Utilizaram as técnicas mescladas da matemática e da mecânica para forjar maravilhas tecnológicas cada vez mais precisas que até hoje encantam pela beleza estética, engenhosidade e, algumas vezes, luxo.


Caso: Abraham-Louis Breguet


Nascido na Suíça, em 1717, Breguet viveu em Paris em torno de 1762. Abriu sua própria loja em 1775, mas fugiu para a Suíça na Revolução Francesa (1793). Retornou em 1795, recebeu a insígnia de Chevalier de la Légion d´Honneur, e foi eleito (1816) para a Academie Royale des Sciences. Breguet ficou conhecido devido aos seus montres perpétuelles (relógios automáticos), que se carregavam por meio de um peso pivotante. A idéia não era originalmente sua, mas ele a aperfeiçoou, fabricando o peso que reagia ao menos movimento do relógio. As conquistas técnicas e o estilo elegante tornaram Breguet o pai do relógio de pulso moderno.


Seu trabalho, de alta qualidade inovadora, foi recompensado (medalhas, títulos, recompensa financeira) e, o mais importante, tornou-se referência de mercado e um marco histórico de determinada categoria – relógios de pulso. São as maiores glórias que um artista, artesão ou profissional pode ambicionar.


Essa época pré-industrial foi marcada por um utilitarismo que já preconizava a moderna indústria. Além dos relógios, surgiram outros instrumentos científicos de precisão e bastante sofisticados provocando admiração e fascínio. Eram os instrumentos de navegação como sextantes, ampulhetas, astrolábios e bússolas; globos terrestres; barômetros, barógrafos e outros instrumentos meteorológicos; relógios de sol; instrumentos ópticos como telescópios, microscópios e caleidoscópios; instrumentos médicos; aparatos de medição, pesagem e mensuração.


Exercício: Esses instrumentos marcam um momento importante da Revolução Industrial quando a “perfeição” mecânica atinge os mais elevados parâmetros de funcionalidade, estética, precisão e confiabilidade. Antes do surgimento da eletrônica e do espaço virtual, a mecânica era a expressão mais compreensível sobre o mundo real. Até hoje esses instrumentos de precisão, como os relógios, representam status e poder. Veja os sites de algumas dessas pequenas e sofisticadas máquinas de mensurar o tempo:

www.breitling.comDesign arrojado. Sua imagem está ligada à aeronáutica e à precisão exigida pelos pilotos.



www.omegawatches.comDesign sóbrio e elegante. É o relógio do James Bond, o 007 e também dos astronautas. Imagem ligada à exclusividade e luxo.

http://us.tagheuer.com/  Design sóbrio, porém mais esportivo. Imagem relacionada à esportividade. É o relógio do piloto de F! Lewis Hamilton.

www.rolex.comDesign clássico. Imagem associada ao luxo e exclusividade.

www.girard-perregaux.com – Vários tipos de design. Imagem ligada à exclusividade. Seu slogan é Watches for the few since 1791 (Relógios para poucos, desde 1791).

www.wempe-chronometerwerke.deDesign clássico. Imagem de alta precisão. O site está em alemão. Veja a introdução e a lista dos produtos de precisão.

Repare como esses sites possuem uma estética e estrutura muito bem cuidada e em várias línguas. A mecânica de precisão inserida no marketing virtual mais avançado.

Existiam também os chamados instrumentos “filosóficos”. Eram giroscópios, círculos de inclinação magnética, instrumentos de cálculo como o ábaco, os primeiros geradores elétricos, instrumentos pneumáticos (bombas a vácuo) ou químicos (retortas, alambiques, pilões e almofarizes, buretas e pipetas). Esses artefatos feitos em metal brilhante, vidro ou madeira tinham formas e estilos inéditos devido às suas finalidades também inéditas. Apesar de serem feitos para uma utilidade específica, esse utilitarismo não relegou a estética, o capricho e o design a um segundo plano. Esses objetos serviam a uma finalidade objetiva, mas também podiam ornamentar uma mesa, uma estante ou um ambiente. Hoje são preciosas antiguidades e muitas dessas ferramentas impressionam por seu porte aristocrático e harmonia das formas.
  
Exercício – O mercado internacional de artes e antiguidades oferece opções dos mais diversos produtos e preços para o colecionador ou amante da beleza artesanal ou dos primórdios da indústria. Algumas dessas lojas e agentes mais exclusivos sequer aparecem na internet. É o caso da Sra. Corinne Duplouy, responsável pela Monte-Carlo Art Collections S.A.M. no Principado de Mônaco. Ela atende na galeria Sporting D´Iver, na Praça do Cassino. Seu nome ou a sua empresa não constam na internet (pode procurar no google que você não vai encontrar) porque seus produtos são exclusivos e custam a partir de algumas centenas de milhares de euros. É esse tipo de produto ou serviço que alguns autores denominam de “alto luxo” ou “luxo exclusivo”. Há também o “luxo de massa” como os carros BMW e Mercedes Benz, os hotéis Ritz-Carlton ou Four Seasons ou jóias e relógios vendidos em shopping centers e em free-shops de aeroportos e portos. Isso não quer dizer que sejam baratos, mas são produzidos ou distribuídos em uma escala muito maior.

Para conhecer alguns desses produtos

Visite o site www.tresserra.com. É uma empresa espanhola (Barcelona) com filial em Paris que produz alguns dos belos móveis do mundo.

Gosta de maravilhas artísticas? Visite o site www.louvre-antiquaires.com. Veja como há milhares de temas e tipos de produtos oferecidos em dezenas de lojas nesse shopping altamente sofisticado e especializado localizado em Paris.

Quando você for ao exterior aproveite para ver essas maravilhas de perto, afinal a região que compreende Sanit Tropez, Cannes, Nice e Monte Carlo é uma das mais sofisticadas do planeta e com um dos maiores índices de qualidade. Sem contar Paris, Milão, Barcelona, Zurique...

O mundo passou pelas revoluções burguesas na Inglaterra e na França. A metafísica e a lógica tornavam-se a matemática e a física modernas. A alquimia originou a química e as misteriosas ciências da vida cederam lugar às pesquisas biológicas. A astrologia transformou-se em astronomia. As corporações cheias de segredos dos construtores, marceneiros, serralheiros e joalheiros foram substituídas pelas escolas politécnicas de engenharia, mecânica ou de arquitetura. O capitalismo comercial venceu as batalhas contra a nobreza feudal e as terras conquistadas nas Américas, na Ásia e na África garantiram matérias primas, mercados consumidores e terras férteis para potencializar a riqueza européia. Havia um conjunto de conhecimento, recursos naturais e capital disponível para detonar a Revolução Industrial e ela aconteceu.

  
A indústria e os parâmetros de qualidade

No início do século 19, a indústria manufatureira nos Estados Unidos acompanhava o antigo modelo europeu de aprendizagem baseada nos mestres. Isso fazia com que jovens aprendizes passassem anos com seus mestres aprendendo um ofício ou função. Como muitos manufatureiros vendiam seus bens no próprio local de sua produção e de sua moradia, eles zelavam pelos padrões de qualidade exigidos pelos seus clientes. Esse foi o início da qualidade na indústria moderna, mas ainda era um processo individual, subjetivo e dependia das características culturais e técnicas das diversas regiões.

No século 19 ainda não existia um padrão reconhecido nacional ou internacionalmente para a qualidade. O que havia eram alguns produtos excepcionalmente bem produzidos que se tornavam referências ou objetos de desejo das classes dominantes.

O sistema fabril desenvolvido na Inglaterra, entre os séculos 18 e 19, espalhou-se pela Europa e depois por todo o mundo, devidamente turbinado pelo método gerencial e pelas tecnologias desenvolvidas pelos Estados Unidos na primeira metade do século 20 e que lhe garantiram supremacia na Segunda Guerra mundial.


Nesse sistema europeu os diversos setores manufatureiros foram sendo transformados em áreas altamente especializadas. Isso significou a necessidade de se reunirem os empregados em galpões fabris, cada um com suas tarefas e máquinas específicas, vigiados por gerentes, coordenadores ou supervisores que acompanhavam cada passo da produção e garantiam pontualidade, eficiência, disciplina e segurança. Os empregados tiveram cada vez menos autonomia e poder de decisão no local de trabalho. O antigo artesão ou manufatureiro virou proletário urbano. As cidades cresceram, os campos se esvaziaram, a poluição ambiental tornou-se desastrosa e as condições de exploração e insalubridade no trabalho pioraram sistematicamente. É evidente que com esse tipo de tratamento dado aos funcionários, o grau de qualidade dos produtos era razoavelmente questionável apesar das constantes inspeções e auditorias. Cada empregado especializava-se em uma função, era supervisionado e acompanhado por superiores, mas esse sistema estava longe da perfeição organizacional e administrativa.

Foi quando a ciência voltou-se para aperfeiçoar as crescentes burocracias, os sistemas de transporte ferroviário, telefonia e energia elétrica, além dos processos industriais. Surgiam os procedimentos baseados em metodologia científica para garantir eficácia e eficiência, ou seja, qualidade ao longo do processo industrial.
 
Algumas pessoas confundem esses dois termos. Eles se complementam, mas são sutilmente diferentes:

EFICÁCIA – Virtude ou poder de (uma causa) produzir determinado efeito; qualidade ou caráter do que é eficaz; real produção de efeitos.

EFICAZ – Que tem a virtude ou o poder de produzir, em condições normais e sem carecer de outro auxílio, determinado efeito, efetivo; seguro, válido, ativo, infalível, santo.

EFICIÊNCIA – Poder, capacidade de uma causa produzir um efeito real; qualidade ou estado de ser efetivo, efetividade.

EFICIENTE – Que se caracteriza pelo poder de produzir um efeito real.

Fonte: Dicionário Houaiss da língua portuguesa




 A eficácia é o ato concretizado; a eficiência é a potência do ato, ou seja, a capacidade de produzir um efeito. A pessoa eficaz é aquela que cumpre um projeto respeitando orçamento, cronograma e especificações, objetivando a excelência no cumprimento de seus objetivos. A pessoa eficiente é aquela que tem o poder de realizar um projeto e portanto possui credibilidade, experiência, conhecimento adquirido e confiabilidade.

O ato (eficácia) e a potência (eficiência). Ambos se completam. De nada adianta ser eficaz em um projeto ou em um período e não manter um elevado padrão de qualidade e confiabilidade.

O progresso científico do século 19 voltou-se para pesquisas onde os objetivos eram garantir a eficácia e a eficiência da produção industrial de uma maneira que pudessem ser reproduzidos em várias fábricas e instituições em todos os lugares. Buscava-se um sistema, um método para não apenas garantir um patamar mínimo de qualidade, mas para que esse patamar pudesse ser constantemente aperfeiçoado e ampliado.


O tratamento científico da qualidade industrial I – 
Os princípios de Taylor

No final do século 19, os Estados Unidos romperam com a tradição industrial européia e passaram a adotar um gerenciamento científico da qualidade nas suas indústrias e escritórios.

Um dos principais inovadores nesse campo foi Frederick Winslow Taylor (1856-1915). Foi mecânico, operário e graduou-se em engenharia mecânica em um curso noturno. É considerado o pai da administração científica e ficou famoso através de seu livro intitulado Princípios da Administração Científica, publicado em 1911 e aplicado em indústrias nascentes como a Ford, em parceria com Henry Ford. Os termos taylorismo e fordismo provém justamente dessa parceria que revolucionou os primórdios da indústria e lançou os Estados unidos na vanguarda do processo industrial de qualidade na primeira metade do século 20.


Taylor é uma figura controversa. Seu método tornou possível incrementar imensamente a produtividade sem aumentar o número de empregados qualificados. Ele analisou o “chão da fábrica” e organizou as tarefas dos operários em etapas que se sucediam logicamente ao longo do processo de fabricação de um produto. Cada operário especializava-se em uma determinada tarefa e ficava em um posto de trabalho pré-estabecido, as peças lhe chegavam às mãos e ele apenas as inseria no lugar pré-determinado. Peças e procedimentos, ajustes e atividades complementares foram organizadas em um roteiro dentro da fábrica que possibilitaria o máximo de eficiência, racionalidade, economia, qualidade e segurança. Nascia assim a linha de montagem industrial. Por outro lado, essa obsessão pela precisão e organização, essa racionalidade cartesiana, lhe garantiram a acusação de destruir a “alma” do trabalho, de transformar operários em robôs, de desumanizar as fábricas. Algumas das críticas mais contundentes ao taylorismo e ao sistema industrial capitalista foram os filmes Tempos modernos (1936), de Charles Chaplin e Metrópolis (1927), do diretor Fritz Lang.

O método de Taylor foi aplicado também nos processos burocráticos de escritórios particulares e governamentais, nos sistemas de controle de ferrovias, correios, telefonia e distribuição de energia, na época amplamente manuais, pois não havia a automação computadorizada que apenas foi disseminada no final do século 20.

O método de Taylor previa:

 padronização de equipamentos e pessoal;
divisão de funções entre dirigentes (engenheiros e gestores), intermediários (supervisores e fiscais) e operários;
objetivos claros;
e rígida disciplina. 

Seus quatro princípios de administração eram:

O desenvolvimento de uma ciência própria

A seleção científica dos funcionários

A educação científica e desenvolvimento do trabalhador

Cooperação íntima e amigável entre gestores e operários


Taylor criou departamentos estanques dirigidos por engenheiros e lhes deu a responsabilidade de:
  

Desenvolver métodos científicos para o trabalho

Estabelecer metas de produtividade

Estabelecer sistemas de recompensa para os que atingirem as metas

Treinar o pessoal em como usar esses métodos e atingir as metas ou objetivos.

Nem sempre essa racionalidade e disciplina absolutas funcionaram bem para garantir elevados padrões de qualidade. As antigas fábricas tornaram-se lugares sombrios, monótonos, exaustivos e impessoais. Os engenheiros e administradores sentiam-se superiores e infalíveis, arrogantes e à parte do trabalho manual exercido por operários oprimidos apesar de razoavelmente remunerados e inseridos em uma lógica industrial capitalista que os via como “heróis” do vigor econômico do início do século 20. 


Análise:

A data inicial simbólica do fordismo é 1914, quando Henry Ford introduziu seu dia de oito dólares e cinco dólares como recompensa para os trabalhadores da linha automática de montagem de carros que ele estabelecera no ano anterior em Dearbon, Michigan. As inovações tecnológicas e operacionais de Ford eram mera extensão de tendências bem-estabelecidas. A forma corporativa de organização de negócios, por exemplo, tinha sido aperfeiçoada pelas estradas de ferro ao longo do século 19. Os “Princípios de administração Científica”, de F. W. Taylor – um influente tratado que descrevia como a produtividade do trabalho podia ser radicalmente aumentada através da decomposição de cada processo de trabalho em movimentos componentes e da organização de tarefas fragmentadas segundo padrões rigorosos do tempo e estudo do movimento – tinham sido publicados em 1911. E o pensamento de Taylor tinha uma longa ancestralidade, remontando, através de experimentos de Gilbreth, na década de 1890, às obras de escritores da metade do século 19, como Ure e Babbage. A separação entre gerência, concepção, controle e execução também já estava avançada em muitas indústrias. O que havia de especial em Ford (e que distingue o fordismo do taylorismo) era a sua visão, seu reconhecimento explícito de que produção de massa significava consumo de massa, um novo sistema de reprodução da força de trabalho.”


Note que o gerenciamento científico da produção industrial, e do aumento consistente de sua qualidade, exige conhecimentos de engenharia, administração, direito, economia, sociologia e política. No início do processo industrial no século 20, essas concepções ainda eram relativa novidade mesmo nos países mais desenvolvidos. Os Estados Unidos foram pioneiros nas pesquisas sobre racionalização e aprimoramento do trabalho industrial, ao lado dos ingleses e alemães.

Harvey, David. A condição pós-moderna. São Paulo: Loyola, 1993. pág. 121.



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