O problema maior de uma crise é
que ela não surge apenas de carências materiais ou de falhas operacionais. A
questão de fundo é geralmente o despreparo profissional e a falta de uma
mentalidade melhor elaborada, em termos de compreensão real das necessidades e
possibilidades de uma determinada situação, para solucionar uma crise.
Uma grande operação exige
planejamento tático e estratégico, manutenção constante dos equipamentos,
atualização permanente das condições materiais, treinamento, capacidade de
atuar sinergicamente com os vários envolvidos em um problema. Além de
articulação ágil para se conseguir essa sinergia. Isso ainda não existe no
sistema controlador da aviação comercial brasileira, que envolve atores do
setor público (Infraero, ANAC etc.), associações profissionais e as empresas
aéreas privadas, são concessionárias do governo. Sem contar seus inúmeros
fornecedores, públicos e privados: combustível, catering, manutenção, transporte
de bagagens, passageiros e tripulações pelos aeroportos, comunicações,
segurança, saúde, alfândega, migração, atividades de apoio nos aeroportos.
No caso da aviação comercial, o
setor é altamente regulamentado, pois exige padrões de segurança operacionais bastante
elevados. As falhas que não são contornadas ou resolvidas adequadamente podem
provocar mortes e destruição. Porém as situações imprevistas acontecem e às
vezes, um pequeno incidente – ou acidente sem consequências imediatas – pode se
transformar num imenso transtorno com elevados prejuízos.
Foi o que aconteceu semana
passada no aeroporto e Viracopos, em Campinas (SP). Um avião cargueiro MD-11 da
Centurion, uma empresa norte-americana, teve seu trem de pouso danificado em
função do estouro de um pneu, ao aterrisar no aeroporto. A aeronave ficou
parada, sem condições de ser rebocada, em uma das extremidades da pista, mas
deixava ainda 2.500 metros livres. Tudo começou no início da noite do dia 13 de
outubro. Das 19h55 de sábado até às 16h20 da segunda-feira, tempo que o
aeroporto ficou fechado, foram cancelados 512 voos e cerca de 27 mil
passageiros ficaram no chão ou sem poder chegar ao destino. A Azul, empresa que
utiliza o aeroporto como seu hub
principal, ficou com 15 aviões “encalhados” no solo. Os irresponsáveis pela
gestão do aeroporto calcularam os prejuízos em R$ 3 milhões. A Azul calcula o
desastre operacional em R$ 20 milhões.
Porque irresponsáveis?
Os jatos da Azul são fabricados
pela Embraer e decolam em pistas de 1.500 metros. A pista de Viracopos, com 3.240
metros, tinha ainda uma área de escape de 700 metros para possibilitar pousos e
decolagens com segurança, segundo estudos feitos pela Azul. A pista do
aeroporto de Congonhas, em São Paulo, tem 1.700 metros e a do aeroporto Santos
Dumont, no Rio de Janeiro, tem 1.443 metros, uma ponte em uma das extremidades
(a ponte Rio-Niterói) e uma pedra de 400 metros de altura (o Pão de Açúcar) bem
na frente da outra extremidade da pista e os jatos decolam normalmente. A
empresa Azul informou a Infraero e a ANAC sobre isso, pediu autorização para
executar os vôos com essa margem de segurança e foram ignorados pelas
autoridades. Sequer tiveram respostas para suas solicitações. Tivemos um
descaso irresponsável e criminoso por parte das autoridades aeroportuárias.
Esse é o problema das
mentalidades. Durante décadas o controle da aviação comercial brasileira ficou
nas mãos dos militares da Aeronáutica, que não tem, nunca tiveram, competência
para gerir a complexidade de tal sistema. Nenhuma aeronáutica do mundo tem essa
competência, tanto é que, no mundo inteiro, os sistemas são administrados
especialmente pela iniciativa privada e fiscalizados – aí sim – por órgãos
oficiais. No Brasil, a mudança de tal absurdo administrativo é muito recente.
Éramos uma das últimas aberrações do planeta, junto com a Somália, Uruguai e
Argentina, países que ainda tinham os militares mandando na malha área civil.
Ainda impera a mentalidade
autoritária retrógrada e nefasta dos militares da aeronáutica que, no setor
militar, sequer possuem caças decentes para operar nos céus brasileiros.
Trabalha com equipamentos obsoletos, não se envolvem em guerras há décadas (o
que é ótimo), mas também não possuem agilidade para gerenciar crises e atender
as emergências de um sistema que hoje, em 2012, tornou-se maior, mais
sofisticado e complexo do que nos últimos anos graças ao desenvolvimento do
país.
Existe apenas UM equipamento para
atender esses casos. É o recovery kit air,
pertencente à TAM e fica sediado em sua base de manutenção em São Carlos (SP).
Custa cerca de R$ 4 milhões, valor que vários aeroportos podem pagar para ter
com reserva em caso de necessidade. Mas não têm. Isso significa que qualquer
problema desse tipo, em algum aeroporto deste país continental, depende de UM equipamento
privado sediado no interior do estado de São Paulo.
Mas o pior nesse caso, ocorrido
em outubro de 2012, foi a falta de coordenação entre a ANAC e Infraero para
viabilizar a alternativa solicitada pela Azul com respaldo da Embraer, a
fabricante dos jatos. Milhões de reais em prejuízos, 500 voos cancelados, quase
30 mil pessoas prejudicadas porque uns burocratas presunçosos e incompetentes
se recusam a avaliar uma alternativa feita por uma empresa privada.
O agravante, que poucas pessoas sabem, é que essas autoridades foram fiscalizar e pressionar a Azul para que ela atendesse os passageiros e os transferisse para outros voos. Como se reacomodar 500 voos, num final de semana com feriado, quando a ocupação é altíssima, fosse fácil. E num aeroporto a 90 km. da capital e de ouros hubs. Aí já se avança de uma incompetência pública para uma perversão administrativa de má-fé para com a companhia aérea e ignorando solenemente os passageiros. Não resolvem o problema, ignoram a solução proposta pela Azul e pressionam a companhia em uma data difícil, por ser final de feriado prolongado, para resolver algo que deveria ser anteriormente planejado ou resolvido emergencialmente,
É esse preconceito estúpido que ainda marca, graças aos anos de autoritarismo militar e as falhas dos sucessivos governos civis, a gestão da malha aérea civil brasileira.
O agravante, que poucas pessoas sabem, é que essas autoridades foram fiscalizar e pressionar a Azul para que ela atendesse os passageiros e os transferisse para outros voos. Como se reacomodar 500 voos, num final de semana com feriado, quando a ocupação é altíssima, fosse fácil. E num aeroporto a 90 km. da capital e de ouros hubs. Aí já se avança de uma incompetência pública para uma perversão administrativa de má-fé para com a companhia aérea e ignorando solenemente os passageiros. Não resolvem o problema, ignoram a solução proposta pela Azul e pressionam a companhia em uma data difícil, por ser final de feriado prolongado, para resolver algo que deveria ser anteriormente planejado ou resolvido emergencialmente,
É esse preconceito estúpido que ainda marca, graças aos anos de autoritarismo militar e as falhas dos sucessivos governos civis, a gestão da malha aérea civil brasileira.
Esse é o cerne de nossa crise
aérea e de outros problemas nacionais. Mentalidade retrógrada, ao lado da falta
de educação e cidadania.
Luiz Gonzaga Godoi Trigo
Alguns links com matérias a
respeito:
http://www.estadao.com.br/noticias/cidades,viracopos-estuda-ter-kit-de-resgate-de-aviao,946378,0.htm
Nenhum comentário:
Postar um comentário