Tive uma experiência interessante
em termos de consumo. Vi um anúncio (página Ci3 29, do jornal O Estado de São
Paulo, de 28/02/2010) que me revoltou. Era o lançamento de um prédio imenso, de
dezoito andares, bem no meio das areias da praia de Pitangueiras, no Guarujá. A
chamada dizia: “187 m² - 4 dorms. 1º e único prédio na areia”. E o contato por
um site.
Eu vi a foto do anúncio de meia
página e pensei que a prefeitura de Guarujá estava louca, que os empreendedores
tinham ultrapassado todos os limites éticos e urbanísticos e achei
absolutamente estranho tal descaramento. Acessei o site. Tinha a mesma foto
absurda e apenas sete palavras: “Exclusive Beach Pitangueiras – Em breve”, além
de um acesso com os dizeres “Mais informações” onde aparecia uma aba perguntando
como soube do empreendimento e um espaço de pesquisa de opinião com uma única frase:
“Você se interessou por esse empreendimento?”
Escrevi que meu interesse era
pelo absurdo ambiental, urbanístico e empresarial e enviei.Aí surgiu um
agradecimento e a informação de que o projeto era hipotético e servia de base
para uma pesquisa de opinião sobre consumo consciente. Adorei. Não sei quem fez
a pesquisa ou se os dados serão publicados, mas senti-me feliz em ter me
indignado a ponto de imediatamente acessar o site e criticar o projeto, só para
ter o retorno de que fizera a coisa certa.
Consumo consciente é algo
complexo, mas é fundamental para a vida humana, seja a nível individual,
familiar ou social. Uma boa definição é do Instituo Akatu http://www.akatu.org.br/ : “É consumir levando em consideração os impactos provocados
pelo consumo. Explicando melhor: o consumidor pode, por meio de suas
escolhas, buscar maximizar os impactos positivos e minimizar os negativos dos
seus atos deconsumo, e desta forma contribuir com seu poder de consumo para construir um mundo melhor. Isso é consumo Consciente. Em poucas
palavras, é um consumo com consciência de seu impacto e voltado à sustentabilidade.”
A questão abrange os consumidores
finais, mas igualmente os fornecedores, intermediários, empreendedores e todos
os participantes da imensa teia de bens e serviços que nos cerca. Isso
significa o óbvio que é racionalizar água, energia, insumos e matérias primas,
mas significa também atitudes conscientes para evitar desperdícios ou mau
planejamento que gere transtornos e prejuízos. Implica em inteligência
solidária e cidadã para garantir melhorias constantes que beneficiem a
sociedade como um todo. Para a empresa ou instituição essa prática traz três
retornos positivos: os lucros possibilitados pela racionalização de recursos; o
sentimento de dever cumprido face às legislações ambientais; e a boa imagem
institucional, um dos mais valiosos ativos que uma instituição pode ter.
Questiono como alguns
empreendimentos podem conviver com a acusação de terem violentado o meio
ambiente de maneira irresponsável e cínica, como é o caso do shopping Iguatemi,
em Florianópolis; das dunas e manguezais comprometidos por empreendimentos
imobiliários turísticos em toda a costa brasileira; pelo mau uso de recursos
naturais em projetos urbanísticos destinados ao fracasso pelo mau planejamento
e desrespeito aos princípios básicos de capacidade de carga.
O turismo e a hospitalidade
possuem responsabilidade crítica perante o consumo responsável. Os bens e
serviços destinados a essas áreas são desfrutados em um ambiente cultural,
social, econômico e psicológico altamente positivos que significam o tempo
livre, a possibilidade de investir em prazer e bem estar, a vida com qualidade
e riqueza de significados. Tudo isso exige uma responsabilidade social e
ambiental, aspectos profundamente articulados ao consumo responsável. Essas
questões não dizem respeito apenas ao futuro, mas ao presente, onde os
problemas oriundos da ambição desmedida (a ambição é boa na medida certa), do
egoísmo patológico e da irresponsabilidade já originaram uma cota imensa de
desastres e prejuízos, inclusive às corporações envolvidas.
Para aclarar essas questões, a partir da semana que vem acontece, na USP-Leste (Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP), o RTD6, um encontro com pesquisadores nacionais e internacionais para, no contexto do evento Rio + 20, discutir as questões de viagens, hospitalidade, turismo e cultura em relação à sustentabilidade.
Todas as informações estão no site:
http://www.gtci.com.br/rtd6/
Um comentário:
Meu caro Trigo, parabéns pela matéria. De fato, os equipamentos de hospedagem e de entretenimento têm todas as possibilidades de oferecer modelos de sustentabilidade e até de educação ambiental.Aliás, a International Hotel Association propôs, no início da década de 1990 que os novos empreendimentos hoteleiros plantem nos municípios onde são construídos pelo menos duas árvores por UH erguida. Parece pouco, não? Mas foi um começo. Na mesma época a IHA propôs tb o uso dos avisos de opção para a lavagem da roupa de banho. Não foram boas medidas há mais de 20 anos?
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