segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

"O tempo e a câmera"


Assisti O curioso caso de Benjamin Button, com Brad Pitt e Cate Blanchet, um filme com 13 indicações ao Oscar. O tema é o tempo. O nosso tempo: pessoal, misterioso, intangível e inexorável. Me lembrou um filme estranho, Youth without youth (Dir. Francis Coppola, 2007), baseado numa novela de Mircea Eliade. O personagem, Dominic Matei, um professor de filosofia já idoso e prestes a se suicidar, é atingido por um raio. No hospital ele se recupera e começa a rejuvenescer e encontra um novo caminho para sua vida. Há alguma similaridade com Button.
Benjamin Button nasce velho e lentamente começa a tornar-se mais jovem até virar um bebê e morrer. Se pudéssemos manipular o tempo, ter mais alguns anos de vida, beber do elixir da juventude ou da imortalidade, seríamos felizes? Eliminaríamos o sentimento de angústia que perpassa nosso ser? Provavelmente não. A literatura e cinema nos mostram que Todos os homens são mortais (romance de Simone de Beauvoir) e, se fôssemos vampiros seculares (Anne Rice, Stephanie Meyer) ou imortais (Highlander, Simone de Beauvoir...), nem por isso seríamos completos e realizados. A dimensão humana é limitada e só podemos viver sendo companheiros dessa sensação incompreensivel e, segundo Sartre, absurda.
Sinto o que digo, este ano farei 50 anos e isso é um turning around point (ponto máximo de retorno, na aviação comercial) na minha vida, assim como foi ou será na sua se você sobreviver até lá.
Fui buscar um antigo texto que escrevi quando fazia o mestrado em filosofia. O texto foi publicado na revista Reflexão da PUC-Campinas (ano XII, nº 39, 1987, p. 11-18) e seu título é o mesmo desta postagem: o tempo e a câmera. Nele cito filmes de Coppola (Apocalipse Now, Rumble Fish e Outsiders), Highlander ... Em novembro de 2007, estava em Nice e fui assistir esse obscuro filme (Youth...) justamente por causa de Coppola, um dos diretores que marcou minha história, e Mircea Eliade, para mim o mais delicioso escritor sobre mitos e religiões comparadas. Senti, em 2007, o mesmo que senti ao escrever o texto em 1987 e o mesmo que senti ao assistir Benjamin Button este final de semana. O que sinto? Talvez A insustentável leveza do ser ou a familiar sensação de estranheza, tão ricamente descrita por Juan Jose Saer. A única coisa que mudou foi o passar do tempo, que me é lembrado a cada manhã pelo meu espelho e, muitas vezes quando escrevo, pelo labirinto de minha vida. Espelhos e labirintos, tigres e bibliotecas, a vida expressa na simbologia tão rica de Borges.
Que nos resta? Segundo Sartre e vários psicanalistas, uma possibilidade é justamente a arte e a cultura.
Termino com Alvares de Azevedo:
"Sou o sonho de tua esperança
tua febre que nunca descansa
o delírio que te há de matar."
Obs. Assista ao filme.

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Lejano Sur - Final

Fotos: Luiz GG Trigo

O regresso foi em dois dias: Punta Arenas/Santiago, na noite de 15 JAN, com a LAN; e o voo de Santiago/São Paulo, no dia 16, com a TAM. O primeiro trecho foi bem agitado.

Essa foto foi tirada de dentro do aeroporto de Punta Arenas, às 22h30. Note que o avião não está posicionado junto à passarela telescópica (finger) de acesso. O motivo era o forte vento que assolava a área.
O voo atrasou uma hora. Estava previsto para 23h00 e decolou à meia-noite, por causa dos ventos que sacudiam a aeronave no solo.


O embarque foi feito pelo páteo, em meio aos fortes ventos gelados. Tivemos que tirar óculos, bonés, chapeús e qualquer objeto que pudesse ser arrancado pelo vento. Sentamos e esperamos quase uma hora para partir. O avião estava com 100% de ocupação e em pleno voo um passageiro passou super mal o que causou uma pequena agitação a bordo. Chegamos às 03h00 em Santiago.

No dia seguinte fui para o aeroporto para o embarque final. Estava uma festa no embarque da TAM porque uma turma de jovens regressava vitoriosa. São garotas e garotos de Curitiba, do time de voleibol do Círculo Militar do Paraná.



Trouxeram de volta troféus pelas suas vitórias e, segundo me comentaram, ótimas impressões do país que os hospedou.


Claro que voltar vitorioso ajuda a moral de qualquer pessoa que gosta das boas coisas da vida.

Para quem gosta de artesanato um bom endereço é El pueblito de los Dominicos, uma grande vila onde dezenas de lojas vendem artefatos de todos os tipos e materiais. No aeroporto, depois do check in, o destaque a lojinha Roncaly.

Cores suaves, formas bem feitas e design que mescla influências populares e técnicas profissionais de confecção artasanal contemporânea, marcam os produtos da loja.

Alto astral nas compras. Há também bichos de pelúcia regionais (pinguins, morsas, leões-marinhos, guanacos...), vinhos, roupas, badulaques e os indefectíveis souvenirs estereotipados de aeroportos e rodoviárias.

O orgulho da TAM:

O Boeing 777 novinho e imenso. Super confortável, amplo e lindo, mas os equipamentos eletrônicos de entretenimento individual a bordo enchem muito a paciência porque vivem dando pau.

Aproveitei uma promoção especial de up grade para a classe executiva - cool. Inclusive a comida e os vinhos surpreenderam muito favoravelmente.

Self portrait staring the sky...

Os Andes, espinha dorsal do continente, berço de culturas míticas, teto latino, ninho de condores...

Go east!


O céu de São Paulo, visto na chegada.

Home, gourgeous home.

Aterrisando em Guarulhos. Os prédios, bem ao centro, são do campus da EACH (Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP).

Lejano Sur - a bordo

Fotos: Luiz GG Trigo
A vida à bordo não tem nada a ver com os cruzeiros marítimos nos navios imensos, com dois ou três mil passageiros, e sim com os navios pequenos onde o serviço é mais personalizado. Nesse cruzeiro eram 70 passageiros e 33 tripulantes. A comida era excelente, farta mas não em excesso. Bufê de café da manhã com poucos e ótimos itens; almoço empratado, sempre com opção para vegetarianos ou dieta especial; chá das cinco horas da tarde; jantar empratado com entrada, prato principal e sobremesa, sempre leve e saudável.


A cada noite o capitão Constantino Kochifas Cárcamo (nascido em 1931), proprietário de vários barcos de pesca e idealizador dos cruzeiros Skorpios, dava as boas vindas, avisos e comentários, sempre com bom humor. A mensagem era clara: sintam-se em casa e comportem-se como uma família. A bordo são vendidos livros com a biografia do capitão e com as fotos e roteiro da viagem do Skorpios III, além de lembranças, roupas e badulaques com a marca da emoresa.

Na última noite do cruzeiro há um bufê de frutos do mar, mariscos e pescados chilenos. É a única noite onde há um excesso de comida.

Brasileiros são comuns a bordo, mas em pouco número. Além de nós havia apenas essa outra família de São Paulo (Antonio, Rosilene e filhos, Bruno e Thiago). O estilo do navio (slow travel) agrada aos que já tem experiência em viagens, falam inglês e espanhol (as línguas de bordo), não querem baladas barulhentas e apreciam o silêncio e a contemplação. Há muitos idosos (o top era um senhor norte-americano de 90 anos) em ótima forma para andar pelas trilhas e áreas geladas e rochosas.

Todos os tripulantes são chilenos. Educados, sóbrios e discretos, garantem um serviço atencioso e competente.

Em nossa mesa havia esse casal suiço-alemão, Paul e esposa, vistos ao lado de Laderlei e Celi. No começo ele estava arredio às brincadeiras mas tornou-se um companheiro divertido e integrado ao nosso estilo mais, digamos, informal.

Alguns do pratos do bufê: chocolate com molho de frutas vermelhas.

Abacate com centollas. Centolla é um caranguejo gigante (similar ao king crab das águas frias do norte), um prato típico da Patagônia chilena e argentina e muito apreciado. É um prato saboroso, forte e caro. Pode ser encontrado no mercado central de Santiago e nos bons restaurantes chilenos.

Mariscos como locos ou machas são outros frutos do mar típicos da região.

A parte das sobremesas é sempre um delírio calórico que deve ser degustado sem culpa ou vergonha. Como diria Garfield, dane-se a dieta.

O capitão e sua senhora, Mimi. Ela é a responsável pela cozinha e pela governança hoteleira de bordo. Impecáveis e severos, amáveis e atenciosos, o casal cumpre as funções plenas para um cruzeiro agradável. A ponte de comando, casa das máquinas e cozinha são liberados para visitação, ao contrário dos outros navios.

O leitão e o cordeiro patagônico são outras delícias da região.
E assim acaba o cruzeiro no Skorpios. O capitão Constantino acabou com o verbo veranear no Chile e introduziu vacacionar. Assim como na Escandinávia, na antiga Inglaterra e norte da França, as águas frias chilenas entraram no roteiro turistico global graças ao planejamento e empreendedorismo de Constantino e sua equipe. Dá-lhe Chile, um dos lugares mais agradáveis deste continente.

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Lejano Sur - más glaciares

Um casal de amigos e seu filho foram juntos comigo na visita técnica. As fotos a seguir são de autoria desse amigo e mostram a sua visão de turista experimentado frente à natureza selvagem.

Fotos: Laderlei Mangoni

Sentar no último deck para apreciar a paisagem (glaciar Amalia) era uma das experiências repousantes da viagem. Degustar foi um dos verbos mais existencialmente conjugado a bordo. Outro foi desestressar.


Laderlei, Luigi e eu, na parte mais importante do barco, analisando e selecionando as fotos (foram mais de mil), discutindo as atividades e degustando a cultura em taças (Henessy).

As montanhas possuem algo místico para nós, que vivemos em um país com poucas e desgastadas elevações. Conheço os Andes, Pirineus, picos da Europa, Alpes, Rochosas, cordilkheira Antárctica, Mantiqueira e sobrevoei parte dos Himalaias. Mas encaro os Andes como experiência particular mais profunda e significativa para mim.

Flores e neve.

Rochas e gelo.

Bosques e restos dos glaciares que se precipitam, desde milênios, nos leitos dos canais cristalinos e ricos de vida da Patagônia.

Um truque legal: lente da câmera acoplada ao binóculo.

Encalhou nada, o barco deslizava sobre os gelos. Claro que as piadinhas nada originais envolvendo o Titanic vieram à tona.

Essa visão do mundo, a partir de navios, enfeitiça a humanidade por milênios. I la nave va...

... o destino é a viagem.

Essas "cavernas" se formam pelo movimento constante da água e, de repente, uma parede de gelo cai com um estrondo parecido ao de um trovão nas aguas profundas, formando respingos imensos e ondas sucessivas. É bom não estar por perto em um barquinho.

Os picos dos glaciares são esculpidos pelos ventos, pelo sol e pela própria massa de gelo. Lembrei de Solaris, do Estanislaw Lem.

Essas ficaram legais. No voo de ida, o céu estava limpo entre Puerto Montt e Punta Arenas e Laderlei pode fotografar os picos vulcânicos.

Essa é uma foto clássica. Under the volcan...

sábado, 17 de janeiro de 2009

Lejano Sur - the cruise: fjords and glaciars

Fotos: Luiz GG Trigo
Há dois navios Skorpios: o II, construído em 1988 para 130 passageiros e o III, construído em 1995, 1.240 toneladas e capacidade para 110 passageiros. Em nosso cruzeiro (Skorpios III) havia 70 pax. A rota do navio chama-se KAWESKAR. Sai de Puerto Natales rumo norte, aos glaciares Pio XI; glaciar Amalia, no campo de Gelo Sul; fiorde das montanhas; fiorde Calvo; fiorde Antrim; e glaciar El Brujo. O ponto mais ao norte da rota é a vila de Puerto Eden, onde vivem umas 200 pessoas. Entre Puerto Natales e Puerto Eden (uns 500 km) não há um ser humano vivo. Apenas os 33 tripulantes e os passageiros do navio para contemplar alguns dos mais espetaculares cenários do planeta.
Mesmo no verão as temperaturas oscilam entre 7º e 14º C. Com o vento, a sensação térmica é de temperatura ainda mais baixa, é bom sair protegido para o deck. E, claro, óculos escuros. O índice de radiação ultravioleta em Punta Arenas é alto, cerca de 8, quase o mesmo dessa área mais ao norte.

Águas límpidas nos fiordes profundos, estepes verdes nos vales, bosques exuberantes nas partes baixas das montanhas, cumes cobertos de gelo e neve nos topos e glaciares deslumbrantes. São seis dias degustando a paisagem, a gastronomia e ... o open bar.

Casal de amigos que participou da viagem, Celi e Laderlei.

Barcos de apoio levam os passageiros a setores inacessíveis aos navios maiores. As águas são sempre geladas e o uso de colete salva-vidas é obrigatório em todas as saídas do navio.

Home, floating home... alone in the wilderness.

Durante o passeio, pelos fiordes, ao entardecer.
Cascatas de águas puras descem alimentadas pelo degelo. o Skorpios para em um desses fiordes para se abastecer de água.

Bosques...

... e gelos glaciais.


Aventura e contemplação da natureza, nas formas mais radicais. Esses são dois dos tenders do navio (barcos salva-vidas), usados nos passeios para observação mais próxima dos glaciares e desembarque nas poucas praias rochosas.

Neste dia, no glaciar Pio XI, o céu estava azul, sem nuvens e com um ar frio na atmosfera que deixava nossos pulmões turbinados e os neurônios extasiados.

O gelo é colorido, reflexivo ao sol, possui formas delirantes e...

... facetas perigosas. Nem pense em subir num iceberg ou glaciar. As gretas (fissuras visíveis na foto) são traiçoeiras ao peso de um animal e as camadas de gelo não compactadas podem se romper por quase nada.

Mar e montanhas de gelo e de rocha.

E barcos.

E silêncio.

E espanto pelas belas obras que o planeta nos oferece.

O Skorpios tangencia o gelo.

Above the ice. Don´t worry, it´s quite safe.



Luigi, filho de Laderlei e Celi. Ótimo companheiro de viagem e aprendiz de piadas infames.

Dá uma vontade de nadar...

... mas me contenho.

Slow travel. Este é o conceito de turismo no Skorpios, assim como em alguns outros lodges, resorts e barcos do mundo. Lay back, relax and enjoy.

No rush. No panic. No worries.