São Paulo, terça-feira à noite. 22h13. Terminei a aula na EACH um minuto antes das luzes se apagarem. Desci as escadas sentindo as pontas dos degraus metálicos com a ponta dos tênis e percorri a alameda até o estacionamento sob a luz difusa do céu nublado. O vento fresco varria o chão e os cães uivavam ao longe. Entrei no carro e saí para a estrada. Liguei o rádio e cantarolava enquanto ultrapassava os carros lerdos que entopem as pistas. Aí a estação de rádio saiu do ar. Mudei para outra. Saiu do ar. A escuridão era mais profunda que o normal e a cidade sumira nas trevas.
Minha ponte de acesso está interrompida pelas obras na marginal Tietê. Fui para a ponte Casa Verde. Também interrompida. O congestionamento não preconizava nada de bom. Entrei à direita em um desvio e minhas imagens se concretizaram. Estava no meio de um apagão que atingia toda a cidade. Os semáforos desligados e o skyline negro ao redor, várias estações de rádio chiando e o celular sem sinal me colocaram em um thriller de ficção cientifica, afinal todos sabem que antes de uma guerra nuclear ou de um ataque alienígena as luzes e as comunicações são afetadas.
Liguei os faróis de milha, fechei as janelas, liguei o ar condicionado, consegui sintonizar a CBN e fui cortando as ruas e avenidas em semi-caos, com gente e carros atrapalhados pela escuridão e falta de sinalização. Pensei nos que estavam nas estações de trem e metrô, nos corredores de ônibus e em mim, nas ruas imersas na barbárie.
Atravessei o centro e entrei por baixo da praça Roosevelt me espremendo entre carros temerosos e outros, correndo para chegar em casa. Na rua Liberdade as calçadas estavam cheias dos estudantes que deixavam as universidades e os bares entupidos com seus clientes segurando copos no escuro. Pacientemente percorri o congestionamento ouvindo no rádio que o apagão atingia outras áreas além do estado de São Paulo. Pela primeira vez experimentei os sistemas de segurança do meu prédio: os portões automáticos, as luzes de emergência e os elevadores funcionavam muito bem com os geradores, afinal subir 24 andares a pé, no final de um dia cansativo, não é agradável.
De minha janela vi a cidade sem a marca primordial da civilização, seus fogos e luzes. Apenas os hospitais, algumas universidades e prédios estavam iluminados, assim como as avenidas e ruas brilhando com os faróis dos carros tardios. No silêncio eletrônico da noite me deitei, um minuto antes das luzes se acenderem.
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